quinta-feira, 11 de junho de 2015

A TEORIA INTERPESSOAL DE SULLIVAN


A PSIQUIATRIA DE SULLIVAN - O médico psiquiatra estadunidense Harry Arack Sullivan (1892-1949) trabalhou com esquizofrênico pelo qual adquiriu reputação de notável clínico que iniciou as atividades das comunidades terapêuticas, envolvendo-se posteriormente nas áreas clinicas, de consultoria e ensino. É autor de diversos ensaios sobre a esquizofrenia e palestras que resultaram na publicação de seus livros. É reconhecido como um teórico de psiquiatria dinâmica utilizando termos como distorção paratáxica e autoestima como importante no desenvolvimento e nas relações interpessoais. Com isso desenvolveu uma teoria psicológica social da personalidade, segundo a qual a personalidade é um conceito relacional, criando a teoria interpessoal da psiquiatria, pela qual acredita que a personalidade é o padrão relativamente duradouro de situações interpessoais recorrentes que caracteriza uma vida humana. Desta forma, a personalidade é uma entidade hipotética que não pode ser isolada das situações interpessoais, e o comportamento interpessoal é tudo o que podemos observar como personalidade.

TEORIA DA PERSONALIDADE – Para Sullivan a personalidade se constrói na relação com o outro. A sua teoria teve embasamento inicial em Freud, desenvolvendo posteriormente sua própria teoria funcional da personalidade, psicopatologia e terapia, voltando para a linguagem que se mostrava desencaminhadora, precavendo-se das conceituações autoconcretizadoras das teorias rígidas. Enfatizou o papel dos psiquiatras como participantes-observadores na situação clínica, buscando observações objetivas que pudessem lidar com as experiências emocionais do paciente. Observava, com isso, a interação social, definindo a personalidade como sendo o padrão relativo e duradouro de relações interpessoais que caracterizam a vida humana. O seu foco estava na abordagem psicopatológica, o que proporcionou a criação da teoria de campo por meio de processos temporais e interativos. Para ele o dinamismo é o padrão relativo e duradouro das transformações de energia que ele denominou de padrões de comportamento interpessoal recorrentes. Com isso, entende-se que a sua teoria é voltada para as necessidades e ansiedade. Para ele, as necessidades podem ser tanto por satisfação como por segurança, uma vez que ocorre quando são fundamentais em situações de perigo quando não ser satisfeitas; por outro lado, a ansiedade é o motivador primário do comportamento humano. As necessidades por satisfação incluem necessidades físicas - como ar, água, comida e calor - e necessidades emocionais, especialmente por contato humano e por expressar os próprios talentos e capacidades. Ele trouxe pro cenário dos debates a ligação empática, a qual se estabelece entre o cuidador e o bebê, descrevendo a complicada interação dos bebês comunicando tensão e ansiedade, provocando ansiedade no cuidador e levando a respostas-temas as necessidades do bebê. A falha na satisfação dessas necessidades traz como resultado a solidão e a ansiedade. Por isso ele definiu segurança como a ausência de ansiedade. Necessidades por segurança incluem a necessidade de evitar, prevenir ou reduzir ansiedade.
Na sua teoria o autosistema ou autodinamismo foi definido como o dinamismo que é responsável por evitar ou reduzir ansiedade, igualando o self-identidade-ego com os padrões desenvolvidos da pessoa para evitar os desconfortos que surgem a partir da falha dos outros de satisfazer as necessidades fundamentais da pessoa. Esse autosistema existe, como tudo mais puramente dentro de uma estrutura interpessoal e desenvolve um conjunto de mecanismos, denominado operações de segurança que reduz a ansiedade. Essas operações de segurança funcionam de modo bastante semelhante aos mecanismos de defesa dentro da teoria psicanalítica. No entanto, as operações de segurança específicas foram definidas interpessoalmente, ligadas a observações ou experiências reais. Com isso, entende-se que o autosistema advém de experiências interpessoais sempre em desenvolvimento e que as experiências mais difíceis não são necessariamente aquelas que envolvem falha em satisfazer as necessidades da criança, mas a criança sentir a ansiedade do cuidador no processo de responder a estas necessidades. A ansiedade do cuidador provoca ansiedade na criança, promove a necessidade de estabelecer um senso de segurança e conduz a evolução do autosistema e ao desenvolvimento de operações de segurança.
Por sua vez, o autosistema é dividido em três partes - eu bom, eu mau e não eu. O eu bom é um conjunto de imagens, experiências e comportamentos associados a respostas não ansiosas, temas, empáticas e aprovadoras e aceitadoras do ambiente. O eu mau vem a tornar-se associado a idéias, ações e percepções que provocam ansiedade e desaprovação de cuidadores. Algumas situações, no entanto, provocam ansiedade tão intensa que elas são inteiramente desautorizadas e desapropriadas; e, além disso, se tornam parte do não eu. Por fim, a ligação empática torna-se desnecessária e o autosistema opera de forma autônoma dentro da pessoa, desenvolvendo meios cada vez mais complexos e sutis de manejar a ansiedade da pessoa.
As suas contribuições mais significativas estão na definição de apatia, desapego sonolento e desatenção seletiva. Estas operações de segurança foram extraídas da observação de como os bebês e crianças novas reagem a interações dolorosas, como repreensão dos seus pais. Com isso apresentou suas teorias desenvolvimentais, postulando três modos cognitivos desenvolvimentais de experiência cujo grau de persistência na fase adulta é importante para entender a psicopatologia.
O primeiro deles é o modo prototáxico, característico da primeira infância e da infância, envolve uma série de estados breves desconectados experimentados como totalidades sem qualquer relacionamento temporal. Na vida posterior, experiências místicas e fusão esquizofrênica representam experiências prototáxicas persistentes. O segundo modo é o da experiência paratáxica que começa cedo na infância à medida que o autosistema inicia seu funcionamento independente. Ela também envolve uma série de experiências momentâneas; no entanto, elas são registradas em seqüência com conexão aparente uma a outra. Elas podem receber sentidos simbólicos, porém regras de lógica estão ausentes e a coincidência desempenha um papel importante em como o mundo é percebido. O autosistema utiliza experiência paratáxica para buscar comportamentos redutores de ansiedade eficazes e repeti-los, buscando igualdade e previsibilidade. Com isso, ele usou o modo para explicar transferência, lapsos de língua e ideação paranóide.
O terceiro modo é denominado de sintático de experimentar que se baseia no desenvolvimento da linguagem e na validação consensual. Validação consensual é a aceitação das percepções partilhadas dos outros como uma base para definir a realidade objetiva. O mundo e o self são percebidos dentro de regras de lógica, sequenciamento temporal, validade externa e consistência interna. Pensar sobre si mesmo e sobre os outros se torna testável e modificável com base na análise rigorosa de experiências em uma variedade de situações diferentes. A maturidade pode ser definida como o predomínio extensivo do modo sintático de experimentar.
A teoria do desenvolvimento social baseia-se nos modos cognitivos em desenvolvimento. No entanto, relacionamentos interpessoais perturbados podem fazer com que os modos primitivos de experimentar o mundo persistam. Esse modo se caracteriza pela satisfação de necessidades que predominam e a esfera interpessoal na qual as necessidades de satisfação e suas necessidades de segurança resultantes são preenchidas. Cada estágio é também caracterizado pela zona primária de interação - áreas corporais através das quais a pessoa canaliza necessidades, ansiedade e alívio.
Para o autor, a primeira infância, do nascimento ao início da linguagem, caracteriza-se pela necessidade primária de contato corporal e ternura. O modo prototáxico predomina e as zonas primárias de interação são orais e, de algum modo, anais. No momento em que necessidades são preenchidas com um mínimo de ansiedade, o bebê experimenta euforia e um sentimento de bem-estar. No momento que alguma ansiedade está comumente presente nos cuidadores, apatia e desapego sonolento são operações de segurança regularmente usadas, persistindo na vida adulta como uma posição básica desapegada e passiva. Se a ansiedade e a inconsistência são severas, experiências intensas de pavor persistem na vida posterior apresentando-se como estados internos sinistros bizarramente disruptivos observados nos pacientes esquizofrênicos.
A fase da infância, que começa com o início de linguagem utilizável e continua até o início da escola, caracteriza-se pelo foco da criança sobre os pais como o outro de quem louvor e aceitação são buscados. O modo primário de experiência muda para o paratáxico e a zona de interação mais comum é a anal. A criança precisa de um público adulto aprovador. Esta necessidade conduz a uma variedade de áreas de aprendizagem - linguagem, comportamento e autocontrole. Ela pode também ser observada em uma variedade de esforços, tentativa e erro, pela criança para encontrar o que agrada. A gratificação, conduz a um autosistema expansivo com muitas facetas da vida associadas ao bom eu e a autoestima positiva. Ansiedade moderada conduz à ansiedade crônica, incerteza e insegurança. Ansiedade extrema resulta em desistir de comportamento exitoso conhecido em favor de padrões autodestrutivos que preencherão o que veio a ser esperado pelos outros.
A era juvenil cobre as idades de 5 a 8 anos. O desvio do modo cognitivo sintático inicia e o foco interpessoal espalha-se para grupos de pares e para figuras de autoridade externas. Existe a oportunidade para pares e os professores aprovarem e aceitarem comportamentos previamente inibidos dentro da família. Cooperação interpessoal, competição, brinquedo e acordos tornam-se experiências gratificantes. Os jovens aprendem a negociar suas próprias necessidades com um interesse social legítimo sem sacrificar a autoestima no processo. Os riscos de ansiedade excessiva são uma necessidade demasiado grande para controlar e dominar as situações sociais ou internalização de atitudes sociais prejudiciais e restritivas.
A pré-adolescência, idades de 8 a 12, marca o movimento da criança da cooperação e da competição dos grupos de pares embasada em regras para intimidade genuína com um camarada. É essa fase como um estágio particularmente importante no qual o dar e receber com um amigo especial pode reparar e desfazer distorções causadas por ansiedade excessiva em estágios anteriores. A criança dirige-se verdadeiramente para fora da família pela primeira vez e se engaja em um dar e receber livre com uma outra pessoa não afetada pela dinâmica da mesma família. A grande mudança em direção ao pensamento sintático ocorre, embora algumas distorções possam persistir até a adolescência. Uma capacidade para apego, amor e colaboração emerge ou falha em desenvolver-se em face da ansiedade excessiva. Embora exploração sexual possa ser uma parte do relacionamento de camaradagem, ele não viu a sexualidade como um elemento central na pré-adolescência.
A adolescência inicia na puberdade, tem em seu estágio inicial preocupações semelhantes as da pré-adolescência, com a importante exceção de que sensualidade é acrescentada a equação interpessoal. As mesmas necessidades de um relacionamento de partilha especial persistem, mas mudam para o sexo oposto como um escape conduzindo a uma importante oportunidade para aprendizagem ou ansiedade severa. À medida que a pessoa enfrenta a estereotipia culturalmente definida, muitas oportunidades novas para experimentação social podem levar à consolidação da autoestima ou a autoridicularização. A luta para integrar sensualidade com intimidade é realizada por dolorosa tentativa e erro. Se a integração é concluída com o autosistema relativamente intacto, os anos posteriores da adolescência tornam-se uma oportunidade para expandir o modo sintático para áreas como visão consensual de relações interpessoais, valores e idéias, decisões de carreira e interesses sociais.
A sua teoria psicopatológica buscou entender o processo humano fundamental que ocorre dentro dos seus pacientes, especialmente os mais doentes. Para ele, a psicopatologia era resultante de ansiedade excessiva que detém o desenvolvimento do autosistema e, por meio disso, limita tanto oportunidades para satisfação interpessoal como operações de segurança disponíveis. Com isso, pensou que diversos fatores afetam a forma que os distúrbios assumem. O nível de ansiedade em um estágio desenvolvimental particular pode lançar a fundação para uma parte do desenvolvimento. A capacidade cognitiva básica pode desempenhar um papel na escola de operações de segurança confiadas ou retidas. O grau de sucesso obtido interpessoalmente, combinado com quaisquer capacidades usadas, afetam o sucesso posterior. A ocorrência casual de estresses encontrados durante a vida é também um fator.
A sua psicoterapia interpessoal enfatiza que o psiquiatra é um participante-observador em todas as interações com os pacientes, uma vez que quando o profissional interage ativamente com os pacientes, expressões verbais e não-verbais de padrões interpessoais recorrentes tornam-se aparentes. Estas observações então informam o comportamento posterior do terapeuta, deste modo criando uma oportunidade para mudança. Com isso, a terapia elucida os padrões interpessoais do paciente, explorando sua utilidade a serviço das necessidades do paciente e considerando as possibilidades alternativas e mais favoráveis, enfatizando a experiência do paciente das distorções, as necessidades, os padrões e as mudanças potenciais dentro da interação em andamento com o terapeuta. Ele dividiu a terapia em quatro estágios distintos: incepção, reconhecimento, levantamento detalhado e término.
A incepção envolve o comecinho, freqüentemente apenas uma parte da primeira entrevista, durante a qual o contrato e os papéis são estipulados.
O reconhecimento pode prosseguir por tantas quantas 15 sessões, durante as quais o terapeuta identifica os padrões recorrentes dos pacientes e avalia suas qualidades adaptativas e mal-adaptativas.
O levantamento detalhado é um processo prolongado de explorar os pensamentos, sentimentos e memórias do paciente e de avaliar e reavaliar dados de estágios anteriores, buscando reconhecer, esclarecer e mudar distorções paratáxicas persistentes.
Os padrões recorrentes são discutidos dentro do contexto da história desenvolvimental do paciente, necessidades, ansiedades, fracassos e sucessos.
As metas finais da psicoterapia são obter tanta experimentação dentro do modo sintáxico quanto possível e ampliar o repertório do auto-sistema. No momento que estas metas são atingidas, os pacientes são capazes de tornar-se responsáveis por seu crescimento em andamento através de interações interpessoais subsequentes.

O COMPORTAMENTO INTERPESSOAL – Para o autor em estudo o  comportamento é o que se observa, defendendo que a personalidade se constrói na relação com o outro e que os padrões de comportamento são uma característica da personalidade. Assim, o dinamismo é a menor parte da personalidade. Por consequência a personalidade é uma hipótese teórica, cuja unidade de estudo é a relação interpessoal e não a pessoa, e que sua organização consiste em eventos interpessoais que só se manifesta quando a pessoa está se comportando em relação a um ou mais indivíduos, mesmo que estes não estejam presentes. Com isso, entende o autor que a personalidade é o centro dinâmico de vários processos que ocorrem em vários campos interpessoais. As personificações são o resultado da imagem que o indivíduo tem de si mesmo ou de uma outra pessoa, sendo, com isso, um complexo de sentimentos, atitudes e concepções que decorrem de experiências de satisfação de necessidade e de ansiedade. Os estereótipos são personificações compartilhadas por várias pessoas, não existem a priori, são construídas, porque são generalizações de personificações.

REFERÊNCIAS
ATKINSON, Richard; HILGARD, Ernest; ATKINSON, Rita; BEM, Daryl; HOEKSENA, Susan. Introdução à Psicologia. São Paulo: Cengage, 2011.
BERNAUD, J. Métodos de avaliação da personalidade. Lisboa: Climepsi, 1998.
BOCK, A.M et al. Psicologias: uma introdução ao estudo da psicologia. São Paulo: Saraiva, 2001
DAVIDOFF, Linda. Introdução à Psicologia. São Paulo: Pearson Makron Books, 2001.
GAZZANIGA, Michael; HEATHERTON, Todd. Ciência psicológica: mente, cérebro e comportamento. Porto Alegre: Artmed, 2005.
HANSENNE, M. Psicologia da personalidade. Lisboa: Climepsi, 2003.
MORRIS, Charles; MAISTO, Alberto. Introdução à psicologia. São Paulo: Pretence Hall, 2004.
MYERS, David. Psicologia. Rio de Janeiro: LTC, 2006.
SCHULTZ, Duane; SCHULTZ, Sydney. Historia da psicologia moderna. São Paulo: Cengage Learning, 2012.
______. Teorias da personalidade. São Paulo: Cengage Learning, 2014.
WOOLFOLK, Anita. Psicologia da educação. Porto Alegre: Artes Médicas Sul, 2000.


Veja mais aqui.